PCP adverte para sérias ameaças do TTIP

Rolo compressor<br>de soberania e direitos

O PCP vê com apreensão as negociações envoltas em secretismo entre a União Europeia e os EUA sobre a Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento – TTIP, advertindo para as graves consequências que advêm em vários planos de tal acordo para a vida nacional.

O TTIP visa levar mais longe a liberalização do comércio e serviços

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«A ver a luz do dia, o TTIP encerraria sérias ameaças para os direitos sociais e laborais, para diversos sectores da economia nacional, para a saúde pública, a qualidade ambiental e as condições naturais, assim como para a democracia e para a soberania nacional», afirmou a deputada comunista Carla Cruz em debate de urgência sobre o tema realizado dia 16 por iniciativa do Partido Ecologista «Os Verdes».

Na mesma linha se pronunciara logo a abrir o debate o deputado ecologista José Luís Ferreira ao considerar que tratados de comércio livre como o TTIP ou o Acordo Económico Global (CETA) representam «uma ameaça ao desenvolvimento soberano de Portugal, uma ameaça aos serviços públicos e aos nossos valores ambientais».

Daí ter apelado à não ratificação daqueles tratados, tendo presente os «efeitos muito pesados» que os mesmos poderão ter na vida dos povos europeus.

Do lado das bancadas à direita o discurso foi em sentido oposto, com o PSD, por exemplo, pela voz do deputado António Ventura, a ver neste acordo «enormes possibilidades», dizendo que o mesmo tem uma «importância vital para o futuro da União Europeia», e que «todos os sinais são positivos».

Avaliação positiva ao TTIP, embora de forma mais cautelosa, fez também a bancada do PS, com a deputada Lara Martinho, depois de rejeitar que o «acordo» esteja a ser negociado sob secretismo e sem escrutínio, a defender que «Portugal é dos países mais beneficiados» e a considerar que o mesmo traduz a «possibilidade de regulação da própria globalização», ideia corroborada pelo ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, para quem este «diálogo entre os dois grandes blocos» corresponde a um «esforço de regulação da economia mundial», permitindo «fugir à dicotomia da economia proteccionista e desregulada».

Facada nas PME 

Em suma, vantagens que nem o PEV nem o PCP vêem. Pelo contrário, o que se descortina no TTIP, à semelhança do CETA, nas palavras de Carla Cruz, é o objectivo de ir mais longe na liberalização do comércio e serviços, tentando eliminar quaisquer barreiras ao domínio das grandes multinacionais sobre as economias dos estados soberanos».

E este é o ponto (ver caixa). «É só vantagens, só oportunidades para as empresas, anunciam os mesmos que antes defenderem a adesão ao euro dizendo na altura também que tudo era só vantagens», lembrou José Luís Ferreira, taxativo quanto à ideia de que estes tratados «apenas visam proteger as multinacionais» e que «são uma facada na vida das PME».

Daí que Carla Cruz tenha concluído que sendo um «rolo compressor» para a soberania e os direitos dos povos, o TTIP é simultaneamente para o grande capital um «excelente veículo para aumentar a exploração e a acumulação de capitais».

E por isso considerou indispensável a «divulgação do conteúdo, da natureza e dos objectivos do TTIP», exortando o Governo a «promover um amplo debate público» e a informar o País sobre a sua posição no processo negocial.

Por si manifestada de forma clara foi ainda a posição do PCP de que o TTIP deverá obrigatoriamente ser sujeito a processo de ratificação vinculativo pela AR. Mais, enfatizou Carla Cruz, deverá ser rejeitado em nome da «ruptura com o rumo neoliberal, militarista e federalista da União Europeia e da construção de uma outra Europa – de paz, cooperação, progresso e justiça social».

Ameaças a vários níveis

Detalhados pela deputada comunista Carla Cruz foram alguns dos aspectos mais negativos para o nosso País que resultam do que se conhece e está gizado para o chamado Tratado Transatlântico.

Desde logo, do ponto de vista dos direitos e rendimentos dos trabalhadores, não tem dúvidas de que tal acordo representaria um «sério retrocesso», porquanto, assinalou, o que prevê é o «nivelamento por baixo da legislação laboral por via da harmonização com a legislação laboral dos Estados Unidos da América».

Já as pequenas e médias empresas «confrontar-se-ão com mais dificuldades», segundo Carla Cruz, que não escondeu a preocupação da sua bancada face à possibilidade de encerramentos e, consequentemente, à «destruição de postos de trabalho, perda da receita fiscal e aumento das pressões sobre a Segurança Social». E a este respeito referiu a existência de estudos da própria Comissão Europeia que apontam para um «cenário preocupante de destruição de postos de trabalho».

No que se refere à economia portuguesa, prosseguiu, as perspectivas não são também propriamente animadoras. «Os estudos revêm em baixa o nosso crescimento, apontando para um dos piores desempenhos dos países que integram a UE», alertou a deputada do PCP.

Noutro capítulo ainda – a disputa de litígios entre investidores e estados –, considerou que se está perante a «neutralização da justiça estadual e da aplicação da lei em tudo quanto sejam diferendos» que envolvam os interesses dos grandes grupos económicos e do grande capital transnacional.

Não menos grave, para o PCP – e este foi outro ponto chave identificado por Carla Cruz –, é a utilização do TTIP para promover a liberalização e privatização dos serviços públicos em áreas como a educação, a água, a energia, os resíduos sólidos, aprofundando ao mesmo tempo a mercantilização da cultura.

Os efeitos na produção alimentar

Para as consequências profundamente negativas no nosso País decorrentes do Tratado Transatlântico, designadamente no que toca à produção agrícola, chamou a atenção o deputado comunista João Ramos, alertando para as ameaças que pendem em particular sobre a agricultura familiar, as produções menos intensivas, os mercados locais e de proximidade, mas também sobre a soberania alimentar e a qualidade alimentar.

O problema coloca-se desde logo nos diferentes padrões e concepções de produção alimentar que separam de forma irresolúvel os EUA e os países europeus. João Ramos lembrou a utilização mais alargada pelos norte-americanos do cultivo e comercialização de organismos geneticamente modificados (OGM), frisando que com o TTIP será imposta aos europeus a eliminação de restrições ou proibições à sua utilização.

Assinalada foi também a visão menos restritiva que do outro lado do Atlântico têm sobre a utilização de pesticidas e, noutro plano, a inevitável redução de biodiversidade que resulta da utilização de OGM e a dependência a que os agricultores passarão a estar sujeitos relativamente às multinacionais que os produzem.

João Ramos lembrou ainda que nos EUA é aceitável utilizar hormonas nas produções de carne, compostos de clorato nas aves, assim como disruptores endócrinos (substâncias que agem como hormonas no sistema endócrino) – e desta forma os produtores pecuários americanos produzem com custos muito inferiores – prática, observou, que é rejeitada pelos consumidores europeus.

Sublinhado em tom crítico foi ainda o facto de nos EUA não serem reconhecidas as Denominações de Origem Protegida, o que significa que para as autoridades locais «qualquer um produz Queijo da Serra ou Vinho do Porto».

Posto em realce pelo deputado comunista foi ainda o que verdadeiramente significam, a quem servem e que impactes têm nos sectores produtivos nacionais, nomeadamente na agricultura, tratados de natureza idêntica subscritos pela União Europeia e países terceiros. E o exemplo que deu relaciona-se com os acordos com Marrocos e com o Mercosul. Pois bem, tanto Marrocos como o Mercosul competem directamente com os países do Sul da Europa e o que esses tratados fazem é abrir-lhes as portas para colocarem os seus produtos na Europa, observou. E o que sucede em troca? Compram tecnologia e maquinaria em regra produzida no Centro e Norte da Europa, designadamente na Alemanha.

É por experiências como esta que o deputado do PCP aconselhou prudência quando se fala em tratados negociados pela União Europeia, para que não nos façam o «ninho atrás da orelha»...

 



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